domingo, 22 de julho de 2012

Morangos Mofados - Caio Fernando Abreu



Você certamente já ouviu falar de Caio Fernando Abreu. Basta ter um facebook pra volta e meia ver passar alguma “citação” dele. O fato é que tanto Caio quanto Clarice Lispector são os escritores mais desgraçados pela intenção de sabe-se lá quem divulgar frases com qualidade literária duvidosa.

De qualquer forma, quem lê uma vez Caio Fernando Abreu nunca cairá nessas “pegadinhas”.

O autor tem uma escrita visceral e inconfundível, como podemos conhecer em “Morangos Mofados”.

Confesso que, apesar de ter sido eu quem escolhi o livro do mês, tive dificuldades para lê-lo. Não porque o autor escreve mal, mas, por causa da intensidade com que ele consegue transmitir o desencontro: daquele que, a princípio, coloca-se de forma acessível, mas não entregue; de si; e do Outro.

Há muitas cenas fortes. Escatológicas. Violentas.

Quem conseguiu ler numa tacada só os dezoito contos que compõem o livro está de parabéns, porque eu não consegui e talvez nem consiga. Não agora.

Li aos poucos. Não mais que 3 contos por vez.

Creio que desenvolvi uma relação meio ambígua com o escritor: ao mesmo tempo em que admiro sua capacidade de transmitir aquela sensação ruim no estômago que certas situações causam, ele justamente tira esses temas que ficam devidamente escondidos embaixo do tapete.

Valeu conhecê-lo e creio ser bem possível que eu leia outra obra dele, mas, com certeza, será em outro momento.

“Já li tudo, cara, já tentei macrobiótica psicanálise drogas acupuntura suicídio ioga dança natação cooper astrologia patins marxismo candomblé boate gay ecologia, sobrou só esse nó no peito, agora faço o quê?”
“[...] que aconteça alguma coisa bem bonita com você, ela diz, te desejo uma fé enorme, em qualquer coisa, não importa o quê, como aquela fé que a gente teve um dia, me deseja também uma coisa bem bonita, uma coisa qualquer maravilhosa, que me faça acreditar em tudo de novo, que nos faça acreditar em tudo outra vez, que leve para longe da minha boca este gosto podre de fracasso, este travo de derrota sem nobreza, não tem jeito, companheiro, nos perdemos no meio da estrada e nunca tivemos mapa algum chegando. A chave não gira na porta.”
“tem coisa mais autodestrutiva do que insistir sem fé nenhuma?”
“caímos exatamente na mesma ratoeira, a única diferença é que você que pode escapar, e eu quero chafurdar na dor deste ferro enfiado fundo na minha garganta seca que só umedece com vodca”
“Do teu dia, quase não sei, mas sei do teu labirinto em ti, como sei do labirinto dele em mim, do meu labirinto em ti. E também não entendo”
“Dentro de mim, não consigo deixar de pensar que há alguma espécie de sentido. E um alguém dançasse sobre esses intermináveis telhados de dentro de mim.”
“nenhum amigo, só esta tontura seca de estar começando a viver”
“Tenho pensado se não guardarei indisfarçáveis remendos das muitas quedas, dos muitos toques, embora sempre os tenha evitado aprendi que minhas delicadezas nem sempre são suficientes para despertar a suavidade alheia, e mesmo assim insisto [...]”
“A presença do outro latejaria a teu lado quase sangrando, como se o tivesses apunhalado com tua emoção não dita”
“- Mas não seria natural.
- Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem.
- Natural é encontrar. Natural é perder.
- Linhas paralelas se encontram no infinito.
- O infinito não acaba. O infinito é nunca.
- Ou sempre.”

Da carta pessoal de Caio para seu amigo:
“Quem procura não acha. É preciso estar distraído e não esperando absolutamente nada. Não há nada a ser esperado. Nem desesperado.”

Curiosidades:
  • O personagem Benny, da minissérie global “Queridos Amigos” (2008) redigida por Maria Adelaide Amaral, é a fusão de dois personagens escritos por essa roteirista em seu livro “Aos meus amigos”, sendo um deles inspirado em Caio Fernando Abreu, amigo pessoal da escritora.
  • No 13º capítulo dessa minissérie é citado o conto “Pequenas epifanias” (do Caio) que aparecerá aqui no blog como “aperitivo”. Aguardem!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...